O
dicionário diz que coerência é a "capacidade de apresentar um
comportamento constante e um modo de pensar uniforme ou estável". Catarina
Martins (foto) líder do Bloco de Esquerda, formada em Línguas e Literaturas
Modernas, domina bem o dicionário. E por isso sofre. Foi a própria que admitiu
em entrevista ao Público que todos os
dias se arrepende de ter entrado para o barco da governação, rematando, ainda
assim, que tal arrependimento faz parte. Obviamente que a direita e a esquerda
lhe caíram em cima porque a sinceridade está para a maioria dos discursos políticos
como um congelador para o deserto.Não se aguenta.
Catarina
não tem o dom da ubiquidade. Não consegue, por isso, estar em vários locais
(ideológicos) ao mesmo tempo. Apesar de tudo, tenta honrar as linhas mestras do
discurso do Bloco e combater dentro da "geringonça" os ataques que
vão contra essas mesmas linhas. Não se pode ser a favor dos trabalhadores
e agir contra os trabalhadores (por exemplo no congelamento de salários da
Função Pública), nem defender a transparência e depois engolir uma tentativa de
alteração da lei que vai facilitar a opacidade – sim, estamos a falar da Caixa
Geral de Depósitos (CGD) e da manobra perigosa com que o Governo se prepara
para driblar o chumbo do BCE a oito membros da nova administração do banco
público, alegadamente devido à acumulação de cargos que lhes parecem excessivos
e incompatíveis. E a muitos de nós também, não?
Catarina
Martins e o Bloco não se coíbem de criticar o regime político de Angola. É
natural, por isso, que o BE seja o único partido que não enviou nenhum
representante ao congresso do MPLA. Até aqui, tudo em ordem. A questão é que se
não estivesse dentro da "geringonça", o Bloco teria dedicado
muitos minutos a criticar aquilo que definiria como mais uma amostra da
subserviência transversal que mina a política portuguesa. Tem razão, pelo menos
na transversalidade – lá foram todos a Luanda, do CDS ao PCP. O povo diz que
quem cala consente. Catarina não dorme bem com estes consentimentos, é isso? E
se assim for, até quando aguentará a insónia?
O que seria se o Bloco não estivesse ao lado de António Costa
e aparecesse um "petisco" da dimensão do caso "secretário de
Estado dos Assuntos Fiscais vai à bola pago pela Galp"? O rol de questões
fracturantes entre o BE e o PS poderia continuar por este texto abaixo, com uma
referência obrigatória à restruturação da dívida pública, tema que, como
Catarina reforça na entrevista ao Público,
lhe parece tão determinante como o ar que respira. Por isso Catarina respira
mal. E dorme mal. E arrepende-se. Teve a veleidade de o dizer em público. Vamos
ver que preço paga ela, e pagamos nós, por esta fraqueza política, digamos
assim. Ou será que não há aqui fraqueza nenhuma? Catarina também é
actriz.
Legítima defesa o quê?
«De: Dulce Garcia/'Sábado')
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