Transporte de doentes não
urgentes e conservação das estradas vão ficar fora da descentralização , um
dossier tutelado pelo ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita.
Governo apresentou
estimativas financeiras discriminadas por áreas e municípios. Educação leva a
grande fatia do Orçamento
O governo prepara-se para
transferir para o poder local 797 milhões de euros, um valor que vai acompanhar
a transferência de novas competências para as autarquias, na área da Educação. E
é uma transferência em grande escala, a que está prevista neste setor. A
concretizar-se nos termos em que o executivo a prevê, vão ficar sob a tutela
das autarquias 43 262 funcionários (pessoal não docente) e 996 escolas, que
correspondem a 3552 edifícios. Os dados constam de um relatório elaborado pela
secretaria de Estado das Autarquias Locais, a que o DN teve acesso, e que foi
entregue à Associação Nacional de Municípios (ANMP), no âmbito das negociações
que estão a decorrer entre o executivo e as autarquias.
O documento faz a estimativa
dos valores a transferir para o poder local, discriminados por área setorial e
por autarquia. Em termos globais, o montante que será transferido do Orçamento
do Estado (e que sai das contas dos ministérios) para o Fundo de Financiamento
da Descentralização (FFD) ascende aos 889,7 milhões de euros. Deste valor, a
fatia de leão vai para a Educação - os citados 797 milhões. A transferência de
competências na área da Saúde será acompanhada, nas previsões do governo, de um
pacote financeiro de 83 milhões, o setor da habitação terá um orçamento global
de 7,6 milhões de euros e a Cultura receberá 1,1 milhões.
Com os valores que vão
receber, e no que se refere especificamente à Educação, as autarquias terão de
pagar os salários e suplementos remuneratórios de todo o pessoal não docente,
um custo que o executivo estima em 566 milhões de euros. E terão também de
assegurar a manutenção das instalações e equipamentos escolares - para isso
terão 88 milhões de euros anuais. Já para apoio e complementos educativos (por
exemplo, para assegurar a escola a tempo inteiro ou o leite escolar que é
distribuído aos alunos) terão 142 milhões/ano.
A transferência de
competências na área da Educação é um dos dossiês que ainda não está fechado
nas conversações entre o governo e a ANMP. Uma das razões é precisamente a
falta de dados discriminados, por área e por autarquia, dos valores a
transferir, que os municípios vinham pedindo insistentemente.
A proposta do executivo que
tem vindo a ser negociada ao longo dos últimos meses passa para as câmaras
municipais uma longa lista de competências que até agora os municípios só detêm
ao nível do pré-escolar e do primeiro ciclo. A intenção é que todos os ciclos
do ensino básico e secundário fiquem sob a alçada das autarquias, que passam a
ser as proprietárias dos edifícios escolares, ficando responsáveis pela sua
manutenção; passam a ser a entidade patronal de todo o pessoal não docente,
cabendo-lhes a contratação de novos funcionários; e ficam responsáveis por
todos os serviços afetos à escola, das refeições dos alunos à segurança. Fora
da tutela autárquica ficam os professores, que continuam afetos ao Estado
central através do Ministério da Educação, que se mantém também como a entidade
responsável pelas políticas educativas.
No setor da Saúde - outro
que ainda não tem acordo fechado entre o governo e a ANMP - a transferência de
competências é menos abrangente, traduzindo-se na passagem dos centros de saúde
para a esfera municipal. Nas estimativas do governo passam para a alçada
autárquica 1847 funcionários (pessoal não médico). Já nos custos com imóveis
(alguns do Estado, outros arrendados) a estimativa de custos aponta para os 67
milhões de euros. O processo de descentralização na Saúde não abrange os municípios
com Unidades Locais de Saúde, num total de 78.
Fora da equação fica o
transporte de doentes não urgentes (com um custo anual estimado em 47 milhões
de euros), que inicialmente estava previsto na transferência de competências,
mas não veio a concretizar-se. Há, aliás, duas outras áreas em que não haverá
descentralização. A conservação das estradas (16 milhões de euros) e, na área
da Ação Social, os contratos de inserção dos beneficiários do rendimento social
de inserção (RSI), bem como o acompanhamento e animação no apoio à família e
serviço de atendimento (com um custo total estimado de 126 milhões).
Lisboa é o município que
mais recebe: 38 milhões
Quanto à discriminação por
autarquias, Lisboa recolhe a maior fatia das transferências - a previsão é de
38 milhões de euros, 32 milhões para a Educação, cinco para a Saúde. Segue-se
Sintra, com 27 milhões (24 milhões para as escolas). O Porto e Vila Nova de
Gaia têm prevista uma verba de 20 milhões, Loures de 16, Almada 15, Braga e
Amadora de 14, Matosinhos 13 milhões, Coimbra, Guimarães e Gondomar de 12.
Nos termos do acordo firmado
entre o governo e o PSD em matéria de descentralização, os municípios poderão
receber as novas competências durante os próximos três anos, até 2021,
cabendo-lhes a decisão sobre o momento de aderir ao processo de
descentralização.
71 milhões em novas receitas
Além dos 889 milhões que
serão transferidos a partir do Orçamento do Estado, o governo estima uma
receita potencial de 71 milhões de euros para as autarquias, obtidas a partir
das competências que passarão a ser asseguradas a nível local. Por exemplo, nas
contas do Ministério tutelado por Eduardo Cabrita, as autarquias deverão
receber, em taxas de concessão e licenciamento de infraestruturas, equipamentos
e apoios de praia, uma verba orçada em 2,7 milhões de euros. Na educação, as
receitas com refeitórios são estimadas em 53 milhões.
Somadas as transferências
orçamentais a estas novas receitas, o executivo estima que Fundo de
Financiamento da Descentralização chegue, no total, aos 960 milhões. Um número
abaixo dos 1098 milhões que o ministro tinha já referido no parlamento, um
decréscimo que corresponde ao recuo nas três áreas em que já não haverá
transferência de competências, e que somadas representam 189 milhões de euros.
Governo e PSD tentam
acelerar processo.
Com a sessão legislativa no
parlamento já na reta final e dois diplomas essenciais à descentralização - a
lei-quadro e a lei das Finanças Locais - ainda por votar, o governo tenta ainda
fechar este processo até ao encerramento dos trabalhos parlamentares. Foi com
este objetivo que, na última quinta-feira, o ministro da Administração Interna,
Eduardo Cabrita (que tutela este dossier) reuniu com Álvaro Amaro, o
representante do PSD que liderou as negociações com o governo sobre a
transferência de competências para as autarquias. Um encontro em que estiveram
também presentes os líderes parlamentares do PS e PSD, Carlos César e Fernando
Negrão.
Na Assembleia da República
estão dois diplomas chave para todo este processo. A lei-quadro da
descentralização, que chegou ao Parlamento em março de 2017, e a Lei das
Finanças Locais, que foi a debate a 15 de junho último e baixou sem votação, e
que praticamente já não tem tempo para a discussão na especialidade. Ao que o
DN apurou, tanto do lado do PS, como do PSD, ficou a garantia de que será feito
um derradeiro esforço para que a questão da transferência de competências fique
fechada ainda nesta sessão. Já o governo comprometeu-se a acelerar as
negociações com a ANMP.
«Lusa/DN»
«Lusa/DN»