Por: Rodolfo Colhe |
Não querer acreditar
Muitas vezes somos confrontados com notícias que causam alguma agitação e estupefação, mas na realidade somos só cegos que não querem ver.
Na passada quarta-feira o jornal Público, trazia uma chamada de capa significativamente grande com o título “filhos de pais com mais estudos dominam os melhores cursos”, uma notícia baseada num estudo do Edulog, da Fundação Belmiro de Azevedo (aproveito para informar que têm alguns trabalhos interessantes disponíveis) que através de dois tipos de dados, as qualificações dos pais e mães dos estudantes e os apoios sociais que recebem do Estado.
Houve algum choque, eu diria que um pouco cínico em relação á divulgação destes dados. Há cerca de um ano atrás a RTP noticiava que “são precisas cinco gerações para uma família sair da pobreza” com base em um relatório da OCDE. É consideravelmente óbvio que o elevador social está avariado, está lento e não parado, é certo que hoje quem tem menos vive com maior dignidade, mas falta ainda um longo caminho.
As razões para estes resultados, e ainda não li o estudo na íntegra, são algo fáceis de ver e bastante difíceis de resolver, em primeiro lugar o ambiente familiar é certamente importante, e não, não é igual ter uma família sem horários de trabalho regulares onde a família quase nunca se consegue reunir na totalidade e se passa o tempo que se consegue estando juntos a falar sobre como chegar ao final do mês ou uma família com horário fixo em que em casa se fala sobre o mundo, livros, férias etc.. Numa geração marcada por stress e ansiedade numa sociedade que é e se quer globalizada podemos negar estas evidências?
Um fator que o estudo aponta e que sinceramente me causa alguma aflição é o acesso a explicações, a forma como o sistema educativo ainda em prática (espero que as alterações hoje em prática ajudem a resolver o problema) torna quase impossível um aluno atingir notas de excelência sem ter de recorrer a mais do que explicação extra escola. Se o preço médio hoje para uma explicação anda por volta dos 75 € mês o valor despendido anualmente para duas disciplinas ascende fazendo contas por baixo aos 1500 €, dois ordenados mínimos e meio. A maioria dos portugueses pode suportar isto? É obvio que não. A solução para isto poderá passar por uma intensificação das aulas complementares ou de reforço retirando-as dos horários de aula, talvez seja uma boa reivindicação para a classe dos professores em vez dos 9 anos, 4 meses e 2 dias.
Outra dúvida que me fica é a capacidade de uma família de classe média ou média-baixa em suportar financeiramente um aluno a tirar uma licenciatura em que há livros indispensáveis que custam 300€ e que têm taxas de conclusão de 7 anos. Na verdade as dúvidas são poucas, há quem consiga passando por dificuldades enormes.
Hoje e em grande parte por ação do atual governo tem sido dados grandes passos com vista a possibilitar o acesso de todos ao ensino superior, hoje não são só as elites que o conseguem fazer no entanto aquela máxima própria dos filmes de animação “podes ser aquilo que quiseres ser”, não é verdadeira e ainda vai demorar a ser.
Pessoalmente, sou um sortudo cresci numa família que falava sobre como chegar ao final do mês mas também de desporto, política e atualidade, onde se discutia e discute a forma de cada um ver as coisas, frequentei uma explicação de matemática mesmo com as dificuldades que isso criava aos meus país. Tirei uma licenciatura com direito a bolsa de estudo e hoje posso tirar o meu mestrado sem tentar sequer recorrer a esse tipo de apoio.
A consciencialização sobre este tipo de problemas sociais é importantíssima para criar uma sociedade civil capaz e preparada, certamente dedicar tempo a temáticas como esta é mais aborrecido do que ler e partilhar páginas de fake news mas certamente será mais engrandecedor.
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